Dinalva Heloiza
Goiânia, é uma cidade que vive
problemas recorrentes, e esses, se ampliam cada vez aprofundando incertezas e a
desigualdade, que se estabelece em decorrência da falta de políticas afirmativas,
e mais recente com a crise do covid19, os futuros gestores que assumirão em
2021, não podem manter essa postura omissa que já se vê no cerne político da
cidade.
Vivemos novos tempos, e esses exigem
um novo olhar para a cidade, e exigem mudanças que efetivamente estabeleçam um
novo cenário em qualidade de vida a população, com oportunidade e qualificação.
Com a proximidade das eleições
municipais, mais uma vez convidamos a professora Maria Ester, uma das maiores
autoridades em cidades no estado de Goiás, para apontar desafios e soluções que
viabilizem essa necessária mudança, os quais ao menos minimizem os impactos da informalidade
nos espaços urbanos, e ampliem a sustentabilidade dos ambientes em especial no
centro da cidade
Maria Ester, é natural de
Goiânia, professora do Dptº. de Artes e Arquitetura da PUC/Go; arquiteta;
urbanista; doutora e mestra em Geografia Urbana; Conselheira do CAU/Conselho de
Arquitetura e Urbanismo em Goiás e em breve, ela estará assumindo a presidência
da ARCA – Associação para Recuperação e Conservação do Ambiente.
Acompanhe aqui essa entrevista:
Gyn Go Cities - Mesmo com a
necessidade de ainda manter o isolamento físico, conforme orientações da OMS - Organização Mundial de
Saúde, devido a pandemia, o centro de Goiânia retomou perigosamente as
atividades em vários pontos do mercado informal, a exemplo da avenida
Anhanguera, Goiás, rua 4, Paranaíba e 44, como você orientaria essa questão tão
polêmica?
Maria Ester - O aumento do
comércio e serviços na “informalidade” é um cenário que vem sendo desenhado
mesmo antes da pandemia. Coloquei aspas no termo pela nossa própria
incapacidade de resolver a questão do trabalho formal considerando a enorme
burocracia posta para isso. O aumento do número de pessoas com bancas e
barracas nas calçadas e espaços públicos no centro da cidade, vem aumentando
desde que as políticas públicas de desmonte dos direitos sociais foram sendo publicadas.
Com isso, a pandemia não inibiu
muitos desses trabalhadores que buscam alternativas de renda no comércio de
rua. E essa questão deve ser tratada, a partir da gênese do problema e não
simplesmente relocando ou transferindo os ambulantes de lugar. Goiânia já
experimentou o modelo de transferência de lugar desses trabalhadores, o que
culminou com o surgimento de uma das maiores feiras de roupas e calçados do
país e, mesmo com isso não impediu que mais bancas fossem solicitadas em
locação. Será necessário então rever a forma como a mão de obra profissional
tem sido tratada nas políticas públicas.
As pessoas que buscam uma
alternativa de renda, no comércio informal de produtos, provavelmente não
tiveram nenhuma oportunidade de se qualificar em alguma atividade (formal),
mesmo nesse tempo de desemprego. Orientaria, portanto, a elaboração de
políticas públicas de formação de mão de obra profissional para essa atividade
(comércio). Mas devemos somar a isso a manutenção e valorização dos programas
de transferência de renda, para que a população que se viu abandonada pelo
desmonte das leis trabalhistas, possa viver minimamente durante esse período de
crise.
Gyn Go Cities - As áreas da Feira-Hippie e o entorno da Rua 44, estão passando por uma longa restauração daquele espaço, e com elevado índice de impermeabilização do solo, quais os impactos você apontaria nessas ações, diante dos alertas ambientais e urbanos que demandam o cenário?
Maria Ester - O
quadrilátero que engloba a região da 44 possui cerca de 250 mil metros
quadrados, se somar a área da Feira-Hippie, mais 100 mil metros quadrados. Para
se ter uma ideia, corresponde a um pouco mais do que a área de todo parque Lago
das Rosas, setor Oeste.
As vias que fazem parte dessa
importante área comercial estão localizadas a menos de 100 metros do córrego
Botafogo. Com o córrego canalizado e suas margens reduzidas, a via de tráfego
de carros individuais do ponto de vista ambiental, nos coloca diante de um
desastre.
Além da impermeabilização de todo
fundo de vale, APP do córrego, uma reforma que aumenta o volume de esgoto,
resíduos sólidos, o que permite a escavação e impermeabilização de subsolos
naquela localidade, só faria piorar as condições do microclima local.
Com a ausência de um projeto que
olha para aquela localidade como um ponto comercial que conecta a cidade com o estado
e com o país - (a principal rodoviária de Goiânia está situada na rua adjacente
à Avenida 44), os impactos são negativos para além dos efeitos no meio ambiente
urbano.
As condições de trafegabilidade
das pessoas a pé, não são consideradas como prioridade de investimento em
reforma ou requalificação, e assim, trabalhadores e usuários que frequentam o
local correm riscos iminentes de atropelamento, quedas e até mesmo contaminação
por esgoto a céu aberto. Cita-se com isso a falta de acessibilidade no local.
Esse modelo de gestão da coisa publica contribui para que a região faça sofrer quem mora e trabalha ali. Exemplo disso é uma lei que reformou o código de edificações em 2018, cujas emendas de autoria do vereador Anselmo Pereira, passaram a permitir construções sem que nenhum índice urbanístico precisasse ser estabelecido:
“Excepcionalmente para as novas edificações
destinadas a uso misto... na tipologia de macroprojeto, localizadas no Setor
Central ... e nas áreas delimitadas com arranjo produtivo local – APL... ficam
estabelecidos os seguintes parâmetros:
I.
Índice de ocupação de
100% até altura de 14,50 metros...
II.
Não incidirão recuos
frontais, laterais e fundo...
III.
Índice de 100% de
ocupação até 32,00 metros desde que respeitados os afastamentos...;
IV.
...
V.
Índice paisagístico de
25%... podendo ser utilizada cobertura vegetal não permeável;
VI.
... uma vaga para cada
60,00 metros de área construída;
VII. ...Parâmetros calculados pela área do terreno...”
Esse tipo de lei piora o cenário
da urbanização do lugar pois estamos tratando a região central da cidade e a bacia
do córrego Botafogo, com infraestrutura de drenagem da década de 1950.
Isso significa pensar que bairros
como, Vila Nova, Leste universitário e Criméia também contribuem para o aumento
do volume de água a ser drenado para o córrego. Com a quantidade de tecnologia
existente sobre pisos drenantes, com toda a informação e legislação publicada
sobre acessibilidade e sustentabilidade nas edificações e cidades, fica muito
claro que projetos de reforma da região da 44, e as alterações das leis que
incidem sobre o local são sempre em atendimento ao grande empresário construtor
dos galpões de lojas e menos ao restante da população.
Gyn Go Cities - Qual sua
sugestão para os candidatos em campanha, tanto ao cargo do executivo quanto ao do
legislativo?
Maria Ester – Em relação a
região central da cidade, minha sugestão é que tanto legisladores, quanto a
futura gestão que ocupará o executivo municipal, que eles busquem o diálogo com
a comunidade. Tanto a população, quanto as universidades e associações
comerciais tem conhecimento da dinâmica do centro, e quais soluções poderiam
ser colocadas em prática, para que todo o conjunto da sociedade possa ganhar em
qualidade de vida.
A pandemia nos trouxe o desafio
de modificar não somente nossa rotina, mas também, alguns postos de trabalho
deverão migrar, assim como, outros tendem a desaparecer. Os gestores precisam
se pautar nessa nova realidade do trabalho virtual, da mão de obra que usará
computadores, tablets, smartfones para desenvolver atividades e, assim um leque
de oportunidade de uso dos espaços do centro da cidade, poderão ser abertos.
Sabemos que o centro da cidade é
o lugar onde a infraestrutura de urbanização é completa, entretanto algumas
estruturas devem ser reformadas, à exemplo da fiação elétrica.
Mas é imprescindível, que ao fazer
esse investimento e atrair usos diversificados para a região central, essa ação
não poderá acarretar na gentrificação ou expulsão de quem contribui há anos com
sua manutenção, ao contrário, todos os moradores e usuários que hoje sofrem com
a precariedade das instalações de suas atividades devem ser os primeiros a
serrem beneficiados com isenções de impostos, auxilio na manutenção e estímulo
na conservação de atividades históricas. Cinemas, teatros, bares e restaurantes
tradicionais devem ser reabertos com nomes e identidades originais para que um
sentimento de pertencimento comece a fazer parte da população que vive hoje no
centro.
Não devemos nos esquecer de que o
centro reúne a maior quantidade de população em situação de vulnerabilidade,
são famílias inteiras morando nas ruas, e por isso, um projeto de inclusão com
moradia social e renda para essas famílias é urgente que seja iniciado.
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