Dinalva Heloiza
Rosa Maria Berardo, nasceu em 18 de dezembro de 1961 (62 anos), em Monte Aprazível, SP - ela é professora universitária da UFG, cineasta e fotógrafa premiada - no cinema atua como produtora, diretora e roteirista. Formou-se em Comunicação Social e jornalismo pela UFG, onde também é professora titular e orientadora do mestrado e doutorado no Programa de Arte e Cultura Visual da Faculdade de Artes Visuais da UFG. Com um amplo trabalho dedicado às produções que abordam questões de identidade cultural, alteridade, gênero e etnia, sempre com um olhar atento às transformações sociais e culturais.
Em seu currículo
acadêmico consta ainda o mestrado em Artes pela USP; mestrado
em Cinéma et Audiovisuel pela Université Sorbonne Nouvelle - Paris 3;
doutorado em Cinéma et Audiovisuel - Université de la Sorbonne Nouvelle - Paris
3 e ainda Pos-doutorado em Ciências Sociais e Cinema na Universite du
Quebec em Montreal, UQAM, no Canada.
Sua carreira multifacetada, consta uma ampla filmografia, além de ser
primeira mulher a dirigir um filme em Goiás, é também a única cineasta
brasileira a ter realizado 38 filmes sobre a cultura e tradições sobre a Cidade
de Goiás, antiga capital goiana. Desses, 19 são animações sobre a obra de Cora
Coralina, 4 são filmes de ficção, incluindo o longa-metragem "Sem
Retorno", e 3 são documentários.
Em sua filmografia sobre a cidade de Goiás, destacam -se a "Semana Santa em Goiás"
(2007), sobre a celebração religiosa local, e "Romaria do Vão do Moleque" (2007), que registra a
romaria do povo Kalunga. Outros filmes incluem "Cerrado Quanto Custa?" (2007), que aborda os impactos
da monocultura de cana, e "Caçada
da Rainha" (2008), sobre as manifestações culturais de Cavalcante.
Ela também realizou documentários sobre a cultura negra no estado, como "II Encontro Afro de Goiás"
(2009) e "III Encontro Afro de
Goiás" (2010).
Rosa se dedicou à obra de Cora Coralina, criando animações como "A Infância de Aninha"
(2013), baseada em poemas da escritora, e "Cora Coralina - Vida e Obra" (2014), um documentário
sobre sua vida. A série de animações inclui "A Chegada de Aninha" (2015), que reconta sua
infância, e "Os Meninos
Verdes" (2015), com uma mensagem ambiental. Também produziu "Os Causos da Bisavó"
(2019) e "O Carreiro
Anselmo" (2020), que abordam aspectos de sua vida familiar e rural.
A cineasta também valorizou a paisagem de Goiás em filmes como "Romãozinho" (2010), uma
ficção inspirada em lenda local, e "Sem
Retorno" (2019), filmado na cidade de Goiás e no Parque Nacional da
Serra Dourada. Outro destaque "Travessia"
(2012), um curta que explora a psicanálise e a arquitetura goiana.
Outros trabalhos incluem "André
Louco" (1990), o primeiro filme dirigido por uma mulher em Goiás e
premiado na Suiça, e ainda “Marcas da
Ditadura na Vida de um Ator" (2017), sobre a repressão na ditadura
militar. Rosa também documentou a agricultura local em "Festival ABC da Boa Mesa" (2011 e 2012) e "Festa ABC da Boa Mesa"
(2011 e 2012), e a cultura afro-brasileira em "ABA" (2008), que aborda a diáspora africana em Goiás.
Atualmente, ela está produzindo um longa-metragem sobre a vida de
Leodegária de Jesus, que será filmado em Goiás em 2025, com apoio de um prêmio
do Edital Ruth de Sousa, FSA e ANCINE.
Em 2002, fundou a SKÓPOS, a primeira escola de cinema do estado, e em 2010, criou a Casa do Cinema, que se tornou um ateliê de produção audiovisual e uma referência para jovens cineastas goianos.
Rosa também possui um portfólio fotográfico extenso, e registros da
cultura brasileira e internacional, em 2010 foi premiada com o quarto prêmio da
VIII Bienal Internacional de Arte de Roma, categoria Fotografia. Em sua
trajetória de cineasta, conquistou reconhecimento em importantes festivais,
como o Goiânia Mostra Curtas e
o FICA.
Além de sua produção artística, Rosa tem contribuído com seu
conhecimento em diversas universidades no Brasil e no exterior, sendo
professora convidada em instituições renomadas de países como a França, Canadá,
Estados Unidos, México e Marrocos.
Seu nome consta na Biblioteca Virtual da Mulher como uma das
artistas brasileiras que mais se destacou nas áreas de ciência, cultura e
comunicação nos últimos anos.
Nesta entrevista temos a oportunidade única de conhecermos um pouco mais
sobre a trajetória e as perspectivas dessa profissional que tem marcado a
história do cinema e da fotografia em Goiás e no Brasil, e segue inspirando e
formando novas gerações de talentosos cineastas e fotógrafos no Brasil e no
mundo. Ao final desta entrevista, conheça
as premiações e seleções em que a obra de Rosa Berardo, foram selecionadas e
premiadas. E vamos a nossa conversa!
Dinalva Heloiza - Rosa, o que a inspirou a optar pela formação em artes visuais e a especialização em fotografia e artes cinematográficas?
Rosa Berardo: Durante a
minha adolescência, comecei a me interessar profundamente por fotografia.
Sempre frequentava as bancas de revistas no centro de Goiânia e, em uma dessas
visitas, encontrei uma revista sobre fotografia. Não me recordo o nome agora,
mas lembro que era uma das poucas disponíveis na época. Fiquei fascinada e
passei a comprá-la semanalmente. Essas revistas traziam imagens de fotógrafos
brasileiros e internacionais, o que despertou ainda mais o meu interesse. Foi
aí que pensei: “Que área incrível, a
fotografia! ”
A partir dessas leituras, senti também
uma grande vontade de fotografar. Como eu não possuía uma câmera, pedi uma ao
meu pai, e algum tempo depois, ele me presenteou com uma. Isso me motivou a
buscar uma formação e comecei a estudar fotografia na Universidade Católica.
Lá, na Praça Universitária, tive aulas com a professora Rosary Esteves, a quem
admiro profundamente e considero uma grande mestra. Fiz um curso intensivo de
um ano, com aulas diárias, e me dedicava integralmente, passando horas no
laboratório de fotografia da escola.
Gostei tanto da experiência que
decidi trancar o curso de Letras, que estava cursando na universidade, para me
dedicar exclusivamente à fotografia. Foi nesse período que minha paixão pela
imagem fixa nasceu. Naturalmente, o interesse pela imagem em movimento veio
como uma extensão desse amor pelas imagens em geral.
Quando entrei no curso de
Jornalismo, aos 17 anos, fui atraída pela área do cinema, mais do que pela
televisão. Essas duas paixões – fotografia e cinema – foram o ponto de partida
da minha carreira e definiram meu foco profissional desde então.
Após concluir o curso de
Jornalismo em Goiânia, fui para a Universidade de São Paulo (USP), onde fui
aprovada no processo seletivo do mestrado. Na Escola de Comunicações e Artes
(ECA), mergulhei ainda mais nas áreas de fotografia e cinema. Durante esse
período, realizei meu primeiro filme, André
Louco. Esse projeto não foi uma exigência acadêmica, já que o mestrado
era bastante teórico, mas nasceu do meu desejo de concretizar o sonho de
trabalhar com cinema.
André Louco foi um projeto independente, financiado graças ao
Prêmio de Apoio ao Cinema, que recebi por meio da Lei Sarney, em parceria com a
Shell Petróleo do Brasil. Esse filme representou um marco importante na minha
trajetória e consolidou minha dedicação ao universo do audiovisual.
Dinalva Heloiza - E qual a
motivação a levou a idealizar, em parceria com a Cara Vídeo, a fundação da
primeira Escola de Cinema de Goiás, a Skópos? E como você avalia a evolução do
cenário audiovisual goiano desde então?
Rosa Berardo: A motivação
para criar a Skópos veio, em grande parte, da minha própria experiência. Eu
precisei deixar Goiânia muito jovem, logo após concluir a graduação, para
estudar cinema em São Paulo. Depois disso, fui para a França, morar em Paris,
e, em seguida, para o Canadá, onde também continuei meus estudos na área.
Embora essas experiências tenham sido enriquecedoras – afinal, morar fora é uma
oportunidade de crescimento imenso, tanto pessoal quanto profissional - mas, eu
sentia falta de estar perto da minha família.
Percebia também que muitos jovens
em Goiânia, com o desejo de estudar cinema, enfrentavam dificuldades, seja por
falta de opções na cidade ou por não terem condições de buscar essa formação
fora. Foi então que pensei: “Somos uma
cidade grande, com tantas histórias, uma rica cultura e escritores talentosos.
Por que ainda não temos um curso de cinema em Goiás? ”
Com essa ideia em mente, procurei
o padre Bernardo, que na época era o diretor proprietário da Cara Vídeo,
Goiânia. Ele sempre foi uma pessoa incrível, com grande preocupação pelas
questões sociais e a educação – valores que já eram a base da Cara Vídeo. Eles
ofereceram toda a estrutura da locadora, enquanto eu desenvolvi o projeto
pedagógico do curso de cinema. Foi um momento de muita alegria para mim.
A Skópos teve um impacto muito
positivo e, acredito, deu o impulso necessário para despertar o desejo de
muitos goianos em seguir carreira no cinema. Após dois anos, o curso foi
transferido para a Faculdade Cambury, onde passou a ser uma pós-graduação. E mais
tarde, para a UEG, que hoje desempenha um papel essencial para o estado, e o
IFG, que também oferece formação na área.
O cenário audiovisual em Goiás
evoluiu demais, de uma forma impressionante. Podemos dizer que, das novas
gerações, especialmente as dos anos 2000, muitos dos cineastas que surgiram são
ex-alunos da Escola Skópos. Eles já chegavam com experiência em televisão, mas
foi através do impulso da nossa escola que passaram a se dedicar ao cinema. E
hoje, Goiás está entre os grandes produtores de cinema do Brasil. Temos filmes
e cineastas que já conquistaram prêmios internacionais e grandes prêmios
nacionais. A produção em Goiás cresceu muito, e hoje temos várias mulheres
cineastas. Estamos muito bem, com profissionais excelentes, e Goiás não precisa
mais importar profissionais de fora. Temos uma grande competência em todas as
áreas: desde a equipe técnica até a direção. É gratificante ver o estado
alcançar esse nível de excelência.
Dinalva Heloiza - Rosa, como você avalia o impacto do seu pioneirismo ao se tornar a primeira mulher a dirigir um filme em Goiás? E ao comparar aquele período com o cenário atual, como enxerga a evolução e os desafios enfrentados pelas cineastas mulheres no estado?
Rosa Berardo: Quando
estamos realizando algo, muitas vezes nem nos damos conta de que estamos sendo
pioneiras. Fazemos por um sonho, por acreditar em algo. No meu caso, eu era tão
apaixonada por cinema que simplesmente queria fazer um filme. Quando conheci o
conto "O André Louco", do Bernardo Élis, me encantei. E, quando
coloco algo na cabeça, faço de tudo para realizar. Coloquei muita energia nesse
projeto, e essa energia foi crucial, porque, depois que ganhei o prêmio para
realizar o filme André Louco, a
parte mais difícil foi estabelecer a produção em Goiás. A Secretaria de Cultura
da época não recebeu o prêmio e não quis emprestar a conta para que eu colocasse
o dinheiro na conta da secretaria e usasse para fazer o filme.
Na época, havia uma solicitação
para que esse prêmio fosse transferido para uma conta pública, para receber o
dinheiro. Então, não consegui apoio aqui em Goiás. O dinheiro que recebi do prêmio
foi enviado para São Paulo. Em São Paulo, conseguimos uma produtora que recebeu
o dinheiro do filme, e fizemos o filme por lá. Tanto que André Louco é um filme registrado no
cinema paulista, porque, na época, eu não tive apoio nem para começar a fazer o
meu filme aqui. Além disso, ser uma mulher jovem, com 26 anos, dirigindo um
filme foi um desafio enorme.
Trabalhei com uma equipe formada
por profissionais experientes, tanto do Rio de Janeiro quanto de São Paulo.
Enfrentei resistências, especialmente entre os atores, que eram mais velhos e,
muitas vezes, relutavam em seguir minhas orientações. Isso trouxe complicações,
pois percebi que lidava com uma mistura de machismo, misoginia e preconceito em
relação à minha idade. Mas sempre fui uma pessoa forte nesse sentido, e mantive
minha identidade intelectual e artística. Isso causou muitos transtornos, pois
percebi que se tratava de machismo e também preconceitos com a idade. As três coisas,
a misoginia, o machismo e a discriminação pela idade. Mas ao final deu certo.
Acredito que meu trabalho serviu
de inspiração para muitas pessoas, especialmente outras mulheres. É sempre
importante mostrar que, se uma mulher conseguiu, outras também podem. Hoje,
temos muitas cineastas talentosas em Goiás, e é gratificante ver esse avanço.
Apesar disso, ainda há desafios a serem superados, mas a presença feminina no
cinema goiano tem crescido, e os resultados são impressionantes. É maravilhoso
saber que contribuí, de alguma forma, para abrir esse caminho.
Dinalva Heloiza - Quais os desafios enfrentados pelos novos cineastas em Goiás e como a Maison du Cinema – Casa do Cinema Rosa Berardo – tem contribuído para superá-los?
Rosa Berardo: Atualmente,
a Maison du Cinema não está oferecendo cursos de cinema. Estamos focados na
produção de filmes, tanto meus quanto da minha filha, Júlia Berardo. Os
desafios enfrentados pelos cineastas em Goiás hoje giram principalmente em
torno dos editais de financiamento. Felizmente, o governo Lula tem
disponibilizado diversos editais, o que é fundamental para a produção
audiovisual. No entanto, o governo de Goiás não tem tratado a Lei Goyazes com o
devido respeito, e isso prejudica bastante os produtores locais. A falta de
compromisso do estado com a cultura é, sem dúvida, um dos maiores obstáculos
para os cineastas goianos.
No momento, não estou ministrando
cursos na Maison porque estou bastante envolvida com a universidade. Sou
professora da UFG e dedico meu tempo ao mestrado, doutorado e às produções de
filmes e séries de animação, áreas que têm me deixado muito realizada. Esse
envolvimento tem limitado minha disponibilidade para retomar as aulas na Casa
do Cinema, mas é algo que planejo para o futuro. Minha intenção é me aposentar
da UFG em 2026 para me dedicar exclusivamente à Casa do Cinema e aos meus
projetos cinematográficos.
Apesar disso, a Casa do Cinema já
teve um impacto muito significativo. Poderia listar várias pessoas que passaram
por aqui e hoje são cineastas bem-sucedidos. Claro, o talento individual de
cada um foi determinante, mas fico feliz por termos contribuído com essa
“sementinha” da paixão pelo cinema. Ver esses profissionais prosperando é uma
das maiores recompensas do nosso trabalho.
Dinalva Heloiza - Rosa, seu trabalho frequentemente aborda temas como identidade cultural, alteridade, gêneros e etnias. Como você vê a relevância desses temas nos cenários do cinema e na fotografia contemporâneos?
Rosa Berardo: São
temas que sempre me interessaram. Desde muito jovem, por volta dos meus 15
anos, já sentia uma grande curiosidade pelas culturas, especialmente as
chamadas "culturas dos povos primeiros", ou seja, as populações
originárias que habitavam os territórios antes da colonização. Essas culturas,
presentes não só no Brasil, mas em toda a América do Norte e em outros lugares
que, mais tarde, se transformaram em países, sempre me fascinaram.
Essas diferenças, tanto culturais
quanto de gênero, sempre me atraíram, porque sempre achei muito enriquecedor
lidar com o diferente. Estudar e aprender sobre culturas diferentes é
fundamental, porque todos aprendemos muito com elas. Sempre achei muito
limitado viver dentro da minha própria cultura e pensar que os nossos
referenciais de vida, valores e hábitos eram os únicos, certos e
inquestionáveis. Quando temos o privilégio de conhecer culturas diferentes,
passamos a questionar e vemos que é muito pobre considerar que apenas a nossa
cultura está correta, que ela é a única maneira de viver do ser humano, segundo
os padrões culturais que nós conhecemos. Para mim, quanto mais eu posso estudar
e aprender com o diferente, mais valorizo e percebo a importância de não
destruir o outro, de não colonizar, de valorizar e apoiar as diferenças. Esse
contato nos faz questionar nossos próprios padrões culturais e amplia nossa
visão de mundo. Por isso, meu trabalho sempre seguiu essa linha: valorizar,
aprender e apoiar as diferenças, sem impor ou colonizar o "outro".
Acredito que a questão da
identidade, das representações, de gênero e ética no cinema e na fotografia é
extremamente relevante e séria. Vivemos no século das imagens, tanto no século
passado quanto neste século XXI, em que as imagens tomaram os meios de
comunicação e se tornaram um meio de nos comunicarmos. E é muito importante
entender o que é uma imagem. A imagem não é a realidade em si, ela é uma
releitura da realidade. Quando fotografamos ou filmamos, estamos fazendo
escolhas, representando algo ou alguém de uma determinada maneira, com base no
nosso olhar. O cinema e a fotografia, como meios de comunicação, têm uma grande
responsabilidade, pois ao construir a imagem do outro, estamos projetando um
olhar ideológico, político e ético.
Tanto no cinema ou na fotografia,
construir uma imagem positiva da alteridade ou uma imagem negativa e
estereotipada. Isso é algo que venho discutindo há muito tempo e que trabalhei
durante o meu doutorado, que terminei em 2000, na França, sobre a representação
do índio no cinema brasileiro. Nessa pesquisa, eu tomei ainda mais consciência
da importância de que, ao invés de nossa cultura ocidental, dominadora e
colonizadora, representar os outros, as culturas dos grupos étnicos
minoritários – que hoje em dia, infelizmente, são minoritários devido aos
genocídios cometidos contra essas culturas durante os processos colonizatórios
– é fundamental que essas culturas originárias passem a se autorrepresentar.
Ou seja, que essas culturas,
grupos minoritários, como os LGBTQIA+, os grupos negros, indígenas, comecem a
se filmar, a filmar seu cotidiano, a filmar sua cultura, seu universo, com o
olhar deles. Felizmente, isso já está acontecendo. Já temos grandes cineastas
indígenas, cineastas negros e cineastas trans, mas isso ainda precisa ser mais
incentivado, pois o número de cineastas dessas culturas é muito pequeno se
comparado aos cineastas brancos, das culturas dominantes. Essas culturas
minoritárias ainda enfrentam muitas dificuldades e são desprivilegiadas quando
se trata de acesso à possibilidade de se fazer sua auto-representação.
Portanto, o cinema tem uma
responsabilidade enorme em respeito e ética quando se trata de um cineasta
ocidental branco representar outras culturas.
Dinalva Heloiza - E como tem sido a recepção das suas produções em festivais nacionais e internacionais, especialmente aquelas realizadas em parceria com seus alunos e ex-alunos?
Rosa Berardo: Felizmente,
a recepção dos nossos trabalhos em festivais internacionais tem sido muito boa
e gratificante. Acho que isso se deve, em parte, aos temas que abordamos, o que
geralmente têm um forte apelo humanitário, social, infantil ou ambiental. Esses
temas, aliados ao esforço e dedicação de toda a equipe, fazem a diferença.
Sempre digo que o cinema é uma arte coletiva; um cineasta não faz um filme
sozinho, ele precisa de uma equipe. E, nesse sentido, tive a sorte de contar
com pessoas muito competentes e comprometidas ao longo dessas produções.
O resultado desse trabalho
conjunto tem sido recompensador. Nossos filmes têm sido exibidos em países como
França, Canadá e diversas nações da América Latina, além de participarem de
importantes festivais de cinema no Brasil. Entre esses festivais, destaco os de
animação e os grandes eventos de cinema brasileiro em cidades como
Florianópolis e Rio de Janeiro, entre outras capitais.
Um exemplo notável é a série de
animação sobre a Cora Coralina, que atualmente está em exibição na TV Brasil.
Alguns episódios da série já foram aceitos em festivais renomados, reforçando o
alcance e a relevância do nosso trabalho.
Estamos determinados a continuar
nos esforçando para contribuir com o cinema goiano e brasileiro, colaborando
com colegas cineastas para que nossas produções sejam cada vez mais
reconhecidas e apoiadas, tanto no Brasil quanto no exterior. Essa trajetória
tem sido motivo de orgulho e nos impulsiona a buscar novas conquistas.
Dinalva Heloiza - Em sua opinião, qual o papel da fotografia e do cinema na preservação e valorização das culturas locais, especialmente em um contexto globalizado?
Rosa Berardo – Como
mencionei anteriormente, o cinema e a fotografia são fundamentais para a
valorização e a divulgação da importância das diferenças de gênero e culturais.
Eles são meios de comunicação extremamente poderosos, especialmente na era da
internet e das redes sociais, que conectam o mundo inteiro em questão de
milissegundos. Essas conexões, geralmente mediadas por imagens, tornam o cinema
e a fotografia as bases da nossa comunicação contemporânea.
Dinalva Heloiza - Quais as lições você traz relacionadas as suas
experiências como professora convidada em renomadas universidades
internacionais?
Rosa Berardo – Sobre
experiências internacionais, são diversas, também em bienais, revistas, enfim,
eu também dou aulas. Costumo dar aulas no Canadá e fui convidada para lecionar
novamente no próximo ano, 2025, de setembro a dezembro, em Montreal, na
Universidade de Quebec. Essas viagens e contatos, esses intercâmbios são
extremamente importantes, porque aprendo muito com essas experiências. Sempre
digo que aprendemos muito com as diferenças. Morar em um país diferente e
realizar trocas culturais com pessoas de outras nacionalidades nos proporciona
mais ferramentas e informações para aprimorar nossas pesquisas.
Isso influencia diretamente o meu
trabalho em Goiás, porque, quando temos mais ferramentas de trabalho,
conseguimos avançar mais no lugar onde vivemos. Conseguimos progredir e trazer
contribuições positivas para o que fazemos, seja no cinema, nas pesquisas ou em
outras áreas. Especificamente no cinema, essas experiências enriquecem minhas
criações e também impactam as aulas que ministro na UFG. Posso levar novos
conteúdos e perspectivas para os meus alunos, o que, para mim, é um grande
privilégio e uma enorme alegria.
Rosa Berardo – Sobre meus
projetos atuais, aprovei um projeto chamado Leodegária, que aborda a vida da escritora negra Leodegária de
Jesus, a primeira escritora negra goiana a publicar um livro. Ela publicou sua
obra 40 anos antes de Cora Coralina, na cidade de Goiás, mas infelizmente não
obteve reconhecimento, por ser uma mulher negra, enfrentou discriminação racial
e misoginia. Inicialmente, produzi um pequeno documentário sobre ela e, a
partir disso, desenvolvi um projeto de ficção que contará a história de sua
vida e os desafios que enfrentou.
Esse projeto é de grande porte, e
foi aprovado em nível nacional pelo Fundo Setorial do Audiovisual e pela Ancine,
por meio do Edital Ruth de Souza. Convidei para a direção uma jovem cineasta
negra, a Vanessa Gouveia, de Goiânia, que inclusive foi minha aluna e já possui
três curtas-metragens em seu currículo. O filme precisa ser dirigido por uma
mulher negra, alguém que compreenda profundamente as dificuldades enfrentadas
em uma sociedade racista e misógina. Eu serei a produtora geral, enquanto a
Vanessa comandará a direção. Estou extremamente feliz com esse projeto, pois
sempre trabalhei com a ideia de alteridade – o exercício de se colocar no lugar
do outro, percebendo-o como um indivíduo único e subjetivo.
Minha luta tem sido contribuir
para que grupos culturais, étnicos e minorias possam se auto representar e esse
filme está alinhado com essa coerência, ética e o propósito do meu trabalho.
Além disso, estou programando a
inscrição para a segunda temporada da série de animação Aninha – que retrata a infância de Cora Coralina. Já estou
trabalhando nos roteiros, com a intenção de lançar essa nova temporada entre
2025 e 2026.
Conheça a seguir algumas das premiações e seleções conquistadas pelo talento e a obra da fotógrafa, cineasta, produtora e diretora, professora Rosa Berardo.
Rosa tem uma ampla trajetória cinematográfica premiada e selecionada
para grandes Festivais tanto do cinema nacional, quanto internacional. Já em
seu primeiro trabalho como cineasta, quando filmou o curta-metragem “André
Louco”, uma adaptação do livro do autor goiano Bernardo Élis, foi premiado no
Festival de Cinema de Locarno, na Suíça e exibido em Gramado, no Rio Cine
Festival, e Museu da Imagem e Som em São Paulo.
Em 2010, conquistou o Prêmio
de fotografia pela exposição de fotos tiradas no Xingu na Bienal de Roma. Em 2012,
foi homenageada com a Medalha Jaburu uma Homenagem do Conselho Estadual de
Cultura, pelos serviços prestados ao Estado de Goiás no Audiovisual
O curta-metragem A Infância de
Aninha obteve destaque em diversos festivais internacionais. Em 2013,
foi premiado no Festival de Animação do Agreste como Melhor Filme e selecionado
para várias mostras, como a Mostra Ibero-americana de Cinema de Animação –
Baixada Animada (RJ), o Festival de Cinema Popular Brasileiro em Lumiar (RJ), o
Festival Nacional de Curtas-metragens no Vale do São Francisco (PE), e o
Festival de Cinema Asolo (Itália).
Também foi selecionado para importantes festivais como o CineBH (MG), o
Festival do Rio (RJ), o Anim!Arte (RJ), e o Sansueña Film Fest (Madri,
Espanha). Em 2015, continuou sua trajetória de sucesso com seleções no Festival
de Filmes de Faina e no 7º CMS International Children’s Film Festival (Índia).
O curta A Chegada de Aninha
também foi amplamente reconhecido, com participações no Festival de Arte e
Educação Audiovisual de Goiânia (2015), no AsoloArtFilmFestival (Itália), e no
Fica Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental, em Goiás (2016).
O curta de ficção Travessia
teve um bom desempenho em festivais, recebendo o prêmio de Melhor Arte no
Festival Audiovisual Vera Cruz (GO), e prêmios de Melhor Roteiro, Melhor Ator e
Melhor Atriz no Prêmios Curta Vale (BA). Também foi selecionado para o Festival
de Cinema de Asolo (Itália) e o Cinemático Film Festival (México), entre
outros. Em 2015, no Festival de Filmes de Faina, foi premiado com Melhor Filme,
Melhor Fotografia, e Melhor Edição, além de receber várias indicações.
Procissão das Almas foi selecionado para o Dia Internacional da
Animação em 2015.
O curta Os Meninos Verdes
foi amplamente premiado, com vitórias como Melhor Filme Público no Festival de
Cinema Ambiental e Sustentável de Cachoeiro de Itapemirim (ES), Melhor Filme
Ambiental no Festival de Cinema Curta Canedo (2016), e Melhor Animação no 1º
Cine Tamoio Festival (RJ). Foi ainda selecionado para vários festivais,
incluindo o FICA Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental e o FFF –
Festival de Filmes de Faina, onde recebeu diversas indicações. Além disso, foi
destacado na Mostra Ibero Americana de Cinema de Animação de Duque de Caxias
(RJ) e no Dia Internacional da Animação em Goiânia.
Todas essas premiações refletem o reconhecimento nacional e internacional das produções de Rosa Berardo e seu trabalho inovador no cinema e na
animação, o que é pra todos nós um orgulho em representação! E como o aniversário está próximo, já deixo aqui os meus cumprimentos de uma feliz data, com plenitude e muito sucesso nesse novo ciclo que se aproxima! Felicidades, sempre!
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