Dinalva Heloiza
Política e Economia
Em reportagem publicada hoje, e em dias recentes, a BBC Brasil em Washington, através
de seus especialistas faz uma excelente análise dos acordos que estão sendo firmados
entre China e países da América Latina, dentre eles, Brasil, Colômbia, Peru e
Chile, em um giro com duração de oito dias.
O tour à América Latina, é do premiê chinês Li Keqiang e
teve início nesta segunda feira (18/5), em agenda com a presidente Dilma, em
Brasília. O encontro tende levar à um novo patamar a presença da China na
região e reduzir o poder dos Estados Unidos, no aspecto de influenciar políticas
em países latino-americanos, segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Em Brasília, os dois líderes fecharam 37 acordos em várias áreas, entre as quais infraestrutura, energia e mineração. Segundo o governo brasileiro, os acertos envolvem gastos de mais de US$ 53 bilhões, em torno de (R$ 160 bilhões).
O principal investimento anunciado é uma ferrovia que pretende
ligar a região Centro-Oeste ao Pacífico, atravessando o Peru. A obra
facilitaria a venda de produtos brasileiros para a China, hoje feita a partir
de portos no Atlântico, mas é necessário uma grande atenção à este projeto,
pois a ferrovia pretende cruzar um longo trecho da Floresta Amazônica e do
Cerrado Brasileiro, e neste aspecto, possivelmente o projeto enfrentará dura resistência
de ambientalistas e grupos indígenas, os quais certamente serão afetados, sem
mensurar os impactos à que estará exposta a própria floresta.
"Uma estrada no meio da Amazônia para atender ao
mercado chinês (...) seria uma ilusão acreditar que não vai haver
impacto", critica Paulo Adario, diretor da Campanha Amazônia do
Greenpeace.
Adario observou, contudo, que "a ferrovia tem menor
impacto do que a rodovia para o escoamento da produção" e defendeu que
sejam feitos estudos para medir o impacto socioambiental da obra.
Também há desafios de engenharia e custos para a construção
de um trem que cruze a Cordilheira dos Andes e desemboque no Pacífico.
Outro acordo firmado entre a Caixa Econômica e o Banco
Industrial e Comercial da China criará um fundo de US$ 50 bilhões (R$ 152
bilhões) para financiar projetos de infraestrutura no Brasil, cerca de cinco
vezes o valor da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.
Espera-se que Li anuncie novos investimentos até o fim de
sua viagem, no dia 26. Em janeiro, o presidente chinês, Xi Jinping, autoridade
máxima do país, disse que Pequim investiria US$ 250 bilhões (R$ 759 bilhões) na
América Latina na próxima década.
Além de ampliar a influência de Pequim na região, analistas
avaliam que as ações também buscam amortecer os efeitos da desaceleração da
economia chinesa, que força suas empresas a buscar lucros no exterior.
Para Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais
da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo, a China tenta com a visita
"desfazer o argumento de que vem para explorar o continente e criar uma
relação de dependência" com países latino-americanos.
Uma das principais críticas à China na América Latina é a
assimetria em suas trocas comerciais com a região. Os chineses compram
principalmente matérias-primas de países latino-americanas, mas lhes vendem
produtos industrializados, com maior valor agregado.
Ao diversificar seus laços com países latino-americanos para
além do comércio e investir em áreas como infraestrutura, diz Stuenkel, a China
reforça o discurso de que não busca apenas o benefício próprio na relação, mas
integrar a América Latina à economia global.
"São ações que vão tornar a China um ator político e
econômico na região por muitas décadas, e depois disso será impossível cortá-la
da equação".
Entre as empresas chinesas que investiram no Brasil nos
últimos dez anos, destacam-se JAC Motors e Chery (montadoras), Sinopec
(petróleo e gás), Huawei (telecomunicações), Foxconn (eletrônicos), Banco da
China (financeiro) e a Companhia Nacional da Rede Elétrica da China (energia).
Recentemente, a Apex mediou a instalação da uma empresa de ônibus elétricos em
Campinas – a primeira fábrica na América Latina da gigante chinesa BYD.
Mas o que estaria por
trás do apetite bilionário chinês pelo Brasil?
Certamente, é de interesse do país melhorar a logística das
nossas exportação, reduzindo os custos de produtos comprados em grande
quantidade pela China, como soja e minério de ferro.
Apesar de a queda nos preços das commodities ter provocado
um recuo no valor das vendas brasileiras para a China, o país manteve-se como
principal parceiro comercial do Brasil em 2014, quando a corrente de comércio
(soma de importações e exportações) foi de US$ 78 bilhões.
Questionado sobre se haveria também uma estratégia
geopolítica da China no sentindo de ampliar sua influência na América do Sul, o
embaixador Graça Lima descartou a existência de "uma agenda secreta"
e minimizou uma possível perda de protagonismo do Brasil na região.
"Interessa ao Brasil que seus 11 vizinhos progridam,
que tenham um grau de desenvolvimento que sirva para mais estabilidade, mais
paz, mais segurança (na região). Nesse ponto, a China é vista como uma parceiro
bem-vindo", argumentou.
Geopolítica
Para Charles Tang, porém, há sim uma intenção geopolítica,
na medida em que a China busca a se contrapor aos Estados Unidos como potência
global.
Esse é o entendimento também de Renato Baumann, diretor da
área de Relações Econômicas e Políticas Internacionais do Ipea (Instituto de
Pesquisa Econômica e Aplicada). "A China quer expandir suas áreas de
influência e tornar o yuan uma moeda de referência global", afirma ele.
Com enorme volume de reservas internacionais, da ordem de
US$ 4 trilhão, a China também busca diversificar suas aplicações.
Há anos já vem investindo na África, não sem alguma
controvérsia, como por exemplo na construção de ferrovias cuja bitola só serve
para trens chineses ou devido à prática de importar mão de obra chinesa para
essas obras.
Investidores chineses já tentaram trazer mão de obra
nacional na construção de umas das linhas de transmissão de energia da usina de
Belo Monte, no Pará, mas foram barrados pela legislação trabalhista brasileira.
Sobre essas polêmicas, o embaixador Graça Lima disse que o
Brasil "não é totalmente ignorante" e que o país estará atento aos
riscos.
"Para isso que são requeridos mecanismo de
acompanhamento, memorandos de entendimentos, que deixem muito claro que o se
busca é um benefício equilibrado", garantiu.
Para Stephan Mothe, analista da Euromonitor International
baseado no Rio de Janeiro, a crescente participação chinesa na América Latina
reduz a influência dos Estados Unidos na região. Ele diz que, ao passar a
contar com financiamentos de bancos estatais chineses, os países
latino-americanos se tornam menos dependentes de organizações mundiais que
operam na órbita de Washington, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário
Internacional (FMI).
"Os Estados Unidos passam a ter menos alavancagem para
pressionar esses países a adotar novas políticas” afirma Mothe, que morou na
China por quatro anos.
Margaret Myers, diretora do programa de China e América
Latina do Inter-American Dialogue, em Washington, diz que os chineses oferecem
à América Latina e outras regiões um modelo alternativo aos financiamentos dos
Estados Unidos e de órgãos mundiais tradicionais.
Especialistas do modelo econômico chinês avaliam que os
empréstimos de Pequim são mais sujeitos a desvios e ignoram boas práticas
ambientais e trabalhistas.
A oferta global de crédito chinês deverá aumentar ainda mais
nos próximos anos, quando começarem a operar o Novo Banco de Desenvolvimento
(NBD), que a China gerenciará com seus parceiros nos Brics (Brasil, Índia,
Rússia e África do Sul), e o Banco Asiático de Infraestrutura e Investimento
(BAII), capitaneado por Pequim.
Analistas destacam outro aspecto da visita do premiê chinês.
Em seu giro, ele deixará de lado aliados mais próximos de Pequim, como
Venezuela, Argentina, Cuba e Nicarágua, e viajará a países com governos
considerados mais moderados e identificados com os Estados Unidos.
Para Stuenkel, da FGV, a decisão busca mostrar que a China
"consegue trabalhar com todos os lados" no continente.
Jaseon Marczak, vice-diretor do Adrienne Arsht Latin America
Center do Atlantic Council, em Washington, lembra que três dos quatro países
visitados por Li (Chile, Colômbia e Peru) integram a Aliança do Pacífico, bloco
econômico lançado em 2012 e focado no comércio com a Ásia.
Os três países também integram as discussões para a criação
da Parceria Trans-Pacífica (PTT), iniciativa econômica liderada pelos Estados
Unidos e que exclui a China. Para Marczak, ao visitar Colômbia, Chile e Peru, o
premiê chinês fortalece a posição de Pequim nesses países e no Pacífico
latino-americano, contrapondo-se a eventuais riscos da PTT aos interesses
chineses.
Mothe, da Euromonitor International, diz que os movimentos
de Pequim na América Latina também são uma resposta às ações americanas na
vizinhança chinesa. "É como se eles dissessem: se vocês não respeitarem o
nosso quintal, não respeitaremos o seu".
Já Stuenkel, da FGV, avalia que a China por ora não tem
interesse em desafiar os Estados Unidos e fará de tudo para evitar confrontos
com Washington, já que teria muito a perder com um conflito.
E como os Estados
Unidos têm reagido às ações mais recentes de Pequim na América Latina?
Para Myers, do Inter-American Dialogue, a expansão do modelo
chinês de financiamentos e o possível enfraquecimento das organizações
multilaterais arquitetadas por Washington preocupam autoridades americanas.
Por ora, no entanto, ela considera que a reação do governo
americano às ações chinesas na América Latina tem sido discreta.
Um dos poucos pontos de atrito é a construção do Canal da
Nicarágua, maior obra de engenharia do mundo, financiada por um empresário
chinês. A obra está em fase inicial e pretende ligar o Atlântico ao Pacífico,
tornando-se uma alternativa ao Canal do Panamá. Autoridades americanas
afirmaram que falta transparência à obra e cobraram o governo nicaraguense a
sanar preocupações com questões ambientais e fundiárias.
Mas de maneira geral, diz Myers, "o que ouvimos do
Departamento de Estado (americano) é que o que é bom para a América Latina é
bom para todo o hemisfério".
Para Marczak, do Atlantic Council, as ações chinesas na
América Latina não ameaçam os interesses dos Estados Unidos diretamente.
"É importante que a América Latina diversifique sua economia e se
desenvolva, e os investimentos chineses podem ajudá-la a chegar lá".
O problema, diz ele, "é como esses investimentos serão
feitos, o quão transparentes serão e se serão bons para as pessoas que deles
precisam".
"Nos últimos anos a América Latina teve importantes
avanços em transparência e democracia em resposta a demandas populares, e seria
preocupante se os acordos com os chineses fizessem a região retroceder nesses
campos."
Com informações da BBC Brasil e BBC Mundo.
Publicações originais, em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/05/150520_china_visita_america_latina_rb
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